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Contos-->VISITA FRUSTRADA -- 31/03/2000 - 23:05 (Mario Galvão) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

A porta do centro de recuperação estava fechada, ainda. Todavia, a fila de visitantes já era enorme, às oito da manhã.
As pessoas vinham chegando, alguns sozinhos, outros acompanhados por crianças, colocando as palmas das mãos bem abertas sobre o processador automático de identificação.
Um breve zumbido, uma luz verde se acendia e a porta se abria automaticamente para deixar passar mais um visitante, que se juntava aos demais no grande saguão.
Um noticioso eletrônico mostrava os principais acontecimentos num painel na parede lateral e alguns telões mostravam, coloridos, os principais programas matinais, enquanto que dezenas de brinquedos digitais eram disputados pelas crianças. Algumas delas, sentadas no piso imenso do saguão, dourado pelos raios do sol que atravessavam a cúpula acrílica, aproveitavam para por em dia suas tarefas de escola, acessando diretamente em seus palm-tops os programas escolares da rede nacional de ensino.
Com todo aquele movimento, normal para um domingo, a mulher de cinquenta anos, vestida com uma roupa jovem, nem foi notada pelos vigilantes quando desceu do transporte automático. Afinal ela não portava, no pescoço e nos pulsos, nada mais do que os instrumentos e adereços digitais em voga naquele verão no Rio de Janeiro. A única diferença em relação aos demais que ingressavam no prédio era uma bolsa grande que portava, pendendo a tiracolo. Os vigilantes não se preocuparam. Certamente julgavam ser mais brinquedos para as crianças.
Misturou-se a outras mulheres que chegavam, tagarelando e apôs a mão direita sobre o identificador. Luz verde. O primeiro sistema de segurança fora vencido.
Entrou e juntou-se a um grupo que animadamente, jogavam uma espécie de xadrez a oito, manejando joy-sticks e de olhos fixos em enormes telas onde as peças da brincadeira se moviam. Esperavam abrir a porta interna para começar a visita ao presídio, se distraindo. Deixou para ser a última. Não sabia jogar. Se chegasse sua vez, seria inapelavelmente olhada com suspeita.
Sorte imensa! Quando a parceira que a antecedia manejava as peças do jogo na tela, a sirene soou e a porta interna se escancarou. Era hora de começarem as visitas.
Um grupo de vigilantes surgiu no pórtico principal, deslizando rápidos, andróides que eram, sobre o pavimento, sobre fachos de luz azulada.
Era o momento combinado.
Ela pode ver Carlos aproximando-se da porta, em desabalada carreira, rampa abaixo, seguido por muitas dúzias de feixes de laser violetas e mortíferos, que ao tocarem as paredes metálicas do corredor de acesso, levantavam uma chuva de centelhas e lançavam fagulhas para todos os lados.
Teve, por um instante, a certeza de que conseguiriam.
Quando se preparava para o último salto em direção à porta e ao saguão, entretanto, ele foi atingido. O feixe de laser atravessou-lhe o peito, abrindo um estreito buraco circular no peito do uniforme de prisioneiro. Um robô prateado surgiu, incontinenti, e esticando uma pinça enorme, alcançou a garganta do prisioneiro, dando um golpe de misericórdia e arrastando-o de volta para dentro da prisão.
Tarde demais para disfarçar. A metralhadora antiquada já havia saído de dentro da bolsa, instrumento inútil agora. Atirou-a num repelão, no chão metálico do saguão.
Os andróides se precipitam sobre ela.
Atam suas mãos com algemas, levam-na para dentro, surpresos, sem entender como ela tinha conseguido superar os detectores de metal, discos identificadores e todos os demais sistemas de segurança.
Após a qualificação automatizada, a pergunta fatal:
Cursos de computação e informatização? Suas fichas de implantes?
-- Nenhum seus filhos da puta! Nenhum implante. Vocês não são humanos, são máquinas de merda! Eu os odeio! Quero destruir todos vocês, assassinos!
Do vigilante que se destacava entre os outros, brotou, bem no meio da testa, uma longa haste que terminava em uma espécie de seringa hipodérmica.
De maneira rápida, indolor, Matilde transformou-se ali mesmo, de visita indesejada, em uma nova reeducanda do Centro de Recuperação e Informatização Nacional.
À tarde, ainda naquele domigo, um dos vigilantes comentava, na rodinha do lanche da tarde, com os demais:
-- Menos dois. Agora, neste continente, devem restar talvez não mais que 500 mil. No mundo inteiro talvez não cheguem nem a 5 milhões.
E continuou sorvendo sua dose diária de pastilhas lubrificantes, estirando preguiçosamente as pernas, e dedilhando preguiçosamente os dedos finos, articulados em metal dourado, nas teclas dos microcomputadores individuais cirurgicamente implantados nas coxas nuas, no ventre bojudo e no crânio desmedidamente crescido.
-- Estou adorando a programação desta semana, comentou. Está me fazendo muito bem e aumentando a minha devoção ao grande líder. Vocês não acham ótima a de vocês?
Todos os andróides sacudiram afirmativamente e lentamente suas cabeças, os olhos dourados cintilantes, como sempre admirando a figura dominante e absoluta do chefe.
Lá fora, o sol descia vagaroso para detrás das matas do corcovado, iluminando as ruínas da grande estátua sem braços e sem cabeça que há dois séculos denominavam Cristo Redentor.

Mário Galvão é Profissional de RP e Jornalista.
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